Parte I
E faz hoje 3 meses que deixei Portugal. Os 3 meses mais impressionantes da minha vida. Primeiro que tudo: que país incrível é este a Suíça. Começando pelas paisagens (simplesmente indescritíveis), passando pela simpatia, carinho, alegria e educação das pessoas; destacando também a eficiência e a competência com que esta sociedade se move; não esquecendo a gastronomia (dia não é dia sem muito pão, leite e, claro, chocolate) somando a qualidade de vida, etc; tudo isto me faz adorar viver em terras helvéticas. Também o facto de ter parado numa óptima família, vila e escola ajudam imenso.
Os meus primeiros amigos foram outros “exchange students”, porque fiz com eles um curso de alemão durante um mês, e foi realmente interessante e divertidíssimo! Também a minha irmã de acolhimento, que tem a minha idade, apresentou-me logo aos amigos e amigas (só na minha rua vivem 3) e farto-me de fazer programas. Com o resto da família faço tudo e mais alguma coisa. A proactividade é coisa que não falta aqui.
Já visitei quase metade da Suíça, e também já estive na Alemanha, Áustria e Liechtenstein. Para completar o pacote, tenho uma estância de ski ao lado de casa, e espero agora ansiosamente para começar a esquiar.
Com isto posso dizer que sou bastante sortuda. Mas é certo e sabido, que esta experiência nos transforma. Aqui sim, aqui na minha cabeça é que tudo se move a uma rapidez alucinante. Acordam memórias que nem sabia que tinha; aquelas interrogações, teorias e medos bem complicados e enraizados também se tornam mais distinguíveis; e as saudades, como não podia deixar de ser, desempenham bem o seu papel.
Uma coisa bem distinta na minha experiência é a comunicação. Este é o maior entrave de todos. Ora o alemão, como o senso comum sabe, é tudo menos fácil. Mas eu com estudo e força de vontade até me tenho safado, e sinto bem a evolução. Mas e se eu vos dissesse que eles aqui não falam o alemão que eu aprendo, ou seja o alemão normal, mas sim um dialecto? E isto agora? Imaginem a frustração. Tudo mais ou menos bem, quando falam comigo o alemão correcto, alguns tem a simpatia de o fazer, e na escola, televisão e jornais isso também acontece. Mas entre eles não. Agora imaginem também, tentar fazer amigos sem conseguir falar com eles (é difícil encontrar alguém com um bom inglês), nem as primeiras impressões das pessoas conseguir captar; mesmo parecer simpática é difícil. Então tudo o que seja mais complexo que isto parece impossível. Bem parecia.
Apesar de toda a solidão e frustração que envolvem a dificuldade de comunicação – ou a falta dela – o segredo está na persistência. Porque eu sei que só pode ficar melhor, e cada dia que passa vou aprendendo mais palavras, vou percebendo mais, vou falando melhor. E é tudo isto, a soma das benesses com as dificuldades, que fazem da minha experiência aquilo que ela é: completamente autêntica. Posso portanto concluir que ao fim desta pequena porção de tempo, me descobri. Aprendi, vivi e compreendi mais do que alguma vez imaginei. Percebi com mais precisão quem é que eu sou, mas acima de tudo, quem é que eu quero ser. Sou tão mais autónoma e desenrascada. Bastante mais tolerante. Mais consciente e lúcida. Acima de tudo, ainda mais agradecida pela minha família e amigos, pela minha fé, educação e cultura. Exalto também o enorme orgulho, admiração e nostalgia que tenho do meu querido país, que é Portugal.
Parte II
E vi assim, a uma rapidez alucinante, 6 meses passaram-se!
Desde que aqui cheguei, que tenho uma relação especial com o tempo. O que era antes para mim, algo indefinido e um tanto ignorado, é agora algo altamente preservado, encarado não mais por uma infantil perspetiva. Valorizo-o como nunca o valorizei, pois no fundo, a vida são dois dias.
Estranho é, como é que neste estreito espaço de tempo, tantas coisas tenham acontecido, tanto aprendido, tanto visto, tanto vivido. E tenho esta ânsia de contar tudo, e contar detalhadamente, numa tentativa de ilustrar as minhas aventuras e o que eu estou a sentir. Mas deparo-me com a impossibilidade de o fazer. É algo inexplicável.
Os 3 meses que passaram desde a última vez que escrevi, sinto que foram meses de consolidação. Estou totalmente integrada, tenho os meus amigos, a minha família, a minha casa, escola, os meus hobbies e programas, a minha rotina, etc. Vivo como se sempre aqui tivesse vivido. Existe em mim um profundo sentimento de pertença. Agora é outra coisa. Sinto-me suíça, sinto-me em casa.
Estava com medo do Natal, não passá-lo junto da minha querida e numerosa família prometia um aperto no coração. No entanto, não custou como eu achava. Não vou dizer que não tive saudades, estaria a mentir, porque elas estão sempre aqui, mas tudo o resto compensou. Foi um Natal recheado. Tive direito a tudo: decorações incontáveis, dentro, fora, e em cima das casas, ainda nos restaurantes, escolas e pelas estradas fora, luzes e luzinhas; músicas natalícias e bandas de rua; variadas tradições; gastronomia então nem se fala; frio e do bom; e neve… Esta minha nova amiga… Límpida, branca, pura, esplêndida.
E veio o carnaval, um mês imparável de festas, paradas, muita música e bandas malucas, bebida e dança, misturadas numa multidão desfilando e exibindo os seus fatos, um mais assustador, engraçado ou provocador que o outro. Há que referir ainda que patinagem no gelo, ski e trenó são actividades recorrentes e sempre uma excitação.
Pronto, a minha vida aqui está muito perto de ser um sonho. No entanto, mais importante que todas as actividades e festejos, e das principais razões que me fazem sentir tão bem é a maneira de ser e de estar das pessoas. Como interpretadora sociológica que sou, já cheguei a variadas conclusões sobre este país, e o porquê de serem tão bem sucedidos, completos, e das sociedades mais felizes do mundo. São inúmeros os factores, mas como já tinha referido no meu primeiro texto, posso apontar o respeito, educação, responsabilidade, organização, entreajuda, e por aí fora, com que eles vivem. Bem, isto observando apenas uma amostra da suíça, que entendo que seja uma representação fiel. Ou então estou mesmo rodeada das pessoas certas. No entanto, concluí ainda uma outra coisa: eles são pessoas altamente genuínas. Vejo esta genuinidade em tudo o que eles fazem e a naturalidade que a acompanha. Esta é sem dúvida uma característica peculiar e rara nos tempos que correm.
Ora, mas eu conheço também um povo, com a sua maneira tão própria de ser, com as suas características tão especiais, uma pátria riquíssima e única. É da minha terra que falo, de Portugal, que com orgulho e saudade recordo. Mas alegro-me também ao saber que irei voltar e que terei, se Deus quiser, imenso tempo para contemplar este nosso grande País. No entanto agora só tenho mais 4 meses e meio pela frente, há que viver o momento e fazer destes meses que restam ainda mais espectaculares do que os que passaram.
Muitos beijinhos,
Auf Wiedersehen!
Maria Barreto; estudante bolseira AFS 2014/2015, Suíça